A PANDEMIA está crescendo, matando e deixando sequelas. Mas a população (ou grande parte dela) parece não ter se dado conta disso. Continua sem fazer isolamento social; usando máscara no queixo; máscara com o nariz de fora ou dependurada na orelha; viajando sem necessidade; fazendo festa e provocando ajuntamento – parece que não está nem aí com o vírus.
Muitas explicações apareceram para esse comportamento negligente e perigoso: o povo cansou de usar máscara; ninguém aguenta mais ficar em casa; a população não tem cultura; os jovens não têm juízo; há muito negacionista na praça; o governo não ajuda, e por aí vai…
E é de fato muito estranha negligência, pois a doença provocada pelo novo coronavírus, embora às vezes possa apresentar sintomas leves e até passar por assintomática, é uma doença grave. A covid-19 não atinge apenas os pulmões – ela é uma doença sistêmica, podendo afetar vários outros órgãos do corpo, como coração, rins, intestino, sistema circulatório e até o cérebro.
As sequelas também são terríveis, umas são passageiras; outras, duradouras, e outras ainda podem ser definitivas, como fibrose pulmonar; problemas cardíacos (arritmia); perda de paladar e olfato; fadiga permanente; complicações digestivas; problemas neurológicos (AVC), e até deficiência de cognição descobriu-se que a covid pode causar. E tudo isso, mesmo em pacientes que ficaram assintomáticos ou que tiveram sintomas leves.
Essa doença engana. E não para de crescer no mundo todo. A pandemia já atingiu os cinco continentes, em 180 países (apenas 15 deles não registraram casos de covid, segundo a OMS). O número de casos está chegando a 110 milhões no mundo, e o número de mortes já chegou aos 2,9 milhões. É uma pandemia de proporções literalmente planetária.
E esse – a grande proporção da pandemia – talvez seja o problema que impede as pessoas de enxergarem a gravidade do momento e se comportarem de acordo ela. Entre os que desdenham a doença há muitos negacionistas, sim. Há muita gente desinformada, claro. Há quem opta por apostar na sorte. Há os que consideram a covid apenas uma “gripezinha”. Há de tudo. Mas o fato de a pandemia ser algo gigantesco é um grande empecilho para a entendermos corretamente.
O filósofo inglês Thimoty Morton diz que há coisas tão grandes – chamadas por ele de “hiperobjetos” – que nos cercam e nos envolvem mas são grandes demais para serem vistas e entendidas por completo. Por exemplo, o aquecimento global. Muitos negam. É um fenômeno tão grande, e por isso tão complexo, que não podemos decifrá-lo ou compreendê-lo por inteiro, como deciframos e compreendemos, por exemplo, o transbordamento de um rio após a chuva.
Os hiperobjetos são mesmo difíceis de entender, ainda que estejamos envolvidos e afetados por eles no dia a dia. Ficamos como que perdidos no seu emaranhado. É como se estivéssemos desnorteados no meio de uma floresta imensa: vemos as árvores, enxergamos o chão, olhamos pro céu, mas não podemos saber com certeza onde estamos nem por onde seguir.
Bem por isso que é hora de deixar o negacionismo, a autossuficiência e a confiança no acaso de lado e “ouvir a Ciência”. A pandemia cresce em tamanho e complexidade. Novas cepas estão aí surgindo, mais transmissíveis e mais infectantes. Se não podemos entender completamente a nova doença, porque é algo muito grande, sabemos, ao menos, como fazer para que ela não fique maior ainda.
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