Alguém melhor

       O FIASCO do presidente brasileiro e sua equipe em Davos espantou o mundo. Usando apenas seis minutos dos quarenta e cinco de que dispunha, Jair Bolsonaro fez um discurso raso, vazio. Atropelando as palavras e visivelmente nervoso, não disse nenhuma palavra sobre seu plano econômico no Fórum Econômico Mundial.

       Aqui dentro, os eleitores do presidente votaram no escuro, votaram sem conhecer as propostas dele para a combalida economia brasileira; lá fora, o mundo tinha a expectativa de conhecer essas propostas – ficou sem saber nada.

      Sem exagero, o discurso do presidente lembrou um discurso de camelô: comprem o Brasil!; limitou-se a oferecer o país aos negociantes internacionais. Nenhuma palavra sobre combate à desigualdade, exclusão social, fome, miséria e política externa. Os dados que citou sobre meio ambiente estavam grosseiramente equivocados. Foi humilhante.

       A imprensa mundial ficou perplexa; os empresários desistiram de fazer perguntas ao presidente; os investidores se disseram cautelosos quanto ao Brasil, a Bolsa de Valores despencou. Pra arrematar, o presidente brasileiro acaba de cancelar a entrevista coletiva que daria hoje à imprensa internacional, sob o argumento de que os jornalistas estão muito hostis em relação a ele, por que será?

      Esperava-se, então, que ao menos o Ministro da Economia dissesse alguma coisa mais concreta. Que nada. O monotemático Paulo Guedes só soube falar de “Reforma da Previdência”. Ou seja, o plano econômico do Brasil é fazer uma reforma previdenciária nos moldes daquela que Pinochet fez no Chile – e que está levando os aposentados chilenos ao desespero.

        Talvez então o Ministro da Justiça pudesse ter dito algo de concreto sobre seu plano para a segurança pública e combate à corrupção. Sobre segurança pública, não disse nada; sobre a corrupção, disse que vai fazer um pacto com os empresários; vai combinar com as raposas como é que se toma conta do galinheiro. Santa ingenuidade! Ou seria despreparo mesmo?

       O já folclórico Ministro das Relações Exteriores – aquele que vai combater o demônio do “marxismo cultural” com a ajuda de Deus – nada disse em Davos; e talvez seja o que tenha se saído melhor nessa comitiva.

       Por falar em comitiva, foi bizarra a foto veiculada pela imprensa com Jair Bolsonaro, Sérgio Moro, Paulo Guedes e Ernesto Araújo viajando para Davos a bordo do “Lulão”. Não há como traduzir aquela imagem – esse governo dificilmente será levado a sério; perdeu a sensatez e o pudor – se é que os teve algum dia.

    Enquanto isso, aqui no Brasil, espocam os indícios (e algumas evidências) do envolvimento do filho do presidente com as milícias no Rio de Janeiro. Cedo para emitir algum juízo conclusivo, mas alguns fatos são inquietantes, pois os gabinetes dos Bolsonaro estão atulhados de familiares dos milicianos cariocas.

       O próprio Flávio Bolsonaro confessa que quem indicou essas pessoas para assessorá-lo foi o policial militar Fabrício Queiroz, famoso por nutrir as contas-correntes da família presidencial, e que, quando a coisa aperta, se esconde na favela Rio das Pedras, controlada pelas milícias mais atuantes e violentas da capital fluminense.

       (A mãe e a esposa do chefe do “Escritório do Crime” no Rio de Janeiro, comandante de milícia Adriano Nóbrega, trabalhavam até agora há pouco no gabinete de Flávio Bolsonaro.)

     Não bastasse a inédita militarização do governo federal – os militares estão com 52 cargos em 21 áreas da administração -, vem agora a notícia da sua “milicialização”; Jair Bolsonaro já cogitou legalizar as milícias, e sempre disse que os grupos de extermínio são bem-vindos. (Não acredita? Então procure na internet para vê-lo dizendo isso com suas próprias palavras.)

      Em suma, dá pra entender perfeitamente o desconforto e as palavras do Nobel de Economia, o norte-americano Robert Shiller, na saída da sessão do Fórum em Davos, logo após o discurso de Bolsonaro: abram aspas, “O Brasil é um grande país. Merece alguém melhor”, fechem as aspas.

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