PELO que dizem os especialistas, a eleição de Jair Bolsonaro no Brasil se deveu, primordialmente, aos seguintes fatores: reação antipetista, sentimento anticorrupção, desencanto com a política, forte atuação da Lava Jato e da mídia (às vezes atuando em conjunto) atingindo os partidos tradicionais que governaram o país nos últimos 30 anos – PT, PSDB e PMDB.
Isso teria possibilitado o surgimento de uma figura (uma alternativa salvadora?) que, apesar de estar na política há mais de três décadas, como vereador e deputado, conseguiu “vender” a imagem de um político antissistema, um outsider, seduzindo o eleitorado que o elegeu “contra tudo o que está aí”.
O presidente eleito talvez tenha conseguido passar essa imagem de “político antissistema” pelo fato de que, até ontem, não tinha mesmo nenhuma importância política para o “sistema”; era um político do chamado baixo clero, periférico – fora, portanto, do “núcleo duro” (sistema) de poder.
São interessantes (e procedentes) essas análises porque, de fato, o eleitorado de Bolsonaro “votou no escuro”, sem conhecer nem o homem nem o seu plano de governo; votou seduzido apenas pelas bravatas do candidato (muitas das quais ele já renegou) e pelo desejo de “contestar o sistema”, ainda que para isso tivesse de eleger um político que nunca foi levado a sério.
Não se pode esquecer também que a eleição de Bolsonaro se deu, principalmente, por força de um uso polêmico (para dizer o mínimo!) das redes sociais, sobretudo Facebook e WhatsApp, mais ou menos nos termos do que fez Donald Trump e sua campanha sórdida, baseada em dados obtidos ilegalmente, utilizando robôs e perfis falsos para disparo em massa de fake news destinadas a influenciar a decisão dos eleitores norte-americanos.
Chamou a atenção das autoridades, e da imprensa, que o candidato Jair Bolsonaro, com apenas oito segundos de tempo na tevê, súbito, tenha assumido a dianteira na preferência do eleitorado, liderando todas as pesquisas na reta final da campanha – havia algo de estranho.
Outra coisa muito estranha foi o #Elenão. Um movimento comparável ao das Diretas Já, que repercutiu no mundo todo, não só foi neutralizado pela campanha de Bolsonaro como foi revertido – provocou um aumento de 6% nas intenções de voto a favor do candidato contestado por esse estrondoso movimento de mulheres.
Não demorou, o jornal Folha de S. Paulo revelou o esquema ilegal de mensagens fake enviadas por meio de bots, o Facebook e o WhatsApp admitiram a existência da fraude, e Bolsonaro está sendo investigado por isso no TSE.
A esses fatores, os analistas acrescentam um outro: há uma onda conservadora no mundo todo que tem feito com que partidos de direita cresçam e ganhem maior importância e representação política na América e na Europa – e isso até mesmo em países como a Suécia, onde o Estado de bem-estar social (Welfare State) funciona muito bem, há oitenta anos.
Essa onda conservadora, que dizem ser mundial, teria feito com que os ingleses, apoiados num discurso xenófobo anti-imigração, saíssem da União Europeia, votando a favor do Brexit; teria levado a ultraconservadora Marine Le Pen ao segundo lugar nas eleições da França em 2017; e levado o partido alemão de ultradireita (AfD) a ter representantes no congresso – coisa que nunca havia acontecido desde o pós-guerra (1945).
Os efeitos dessa onda neoconservadora, que se ergueu nos países do chamado capitalismo central, segundo os analistas, se faz sentir também na periferia do mundo capitalista, com a eleição de candidatos da extrema direita como Viktor Orbán na Hungria, Rodrigo Duterte nas Filipinas e Jair Bolsonaro no Brasil, por exemplo.
Resta saber se isso é apenas uma “onda”, dessas que vêm e que vão, ou se é um movimento geopolítico planejado, executado em vários países, destinado a fixar-se como projeto ou paradigma de uma globalização autoritária e excludente.
Há sinais de que seja um movimento deliberado, e não uma simples guinada (“onda”) na preferência de eleitores. Há algumas evidências de que o eleitorado, ao redor do globo, esteja sendo monitorado (e fortemente influenciado) por meio de poderosas ferramentas da internet, via redes sociais.
Dois nomes da internet são frequentemente citados como fundadores e integrantes desse “movimento ultraconservador” que se espalha pelo mundo através do meio digital: Robert Mercer e Steve Bannon.
O primeiro (um homem de rara inteligência, muito discreto, mas profundamente ideológico) é de extrema direta e apontado como o responsável por articular a psicometria (dados psicológicos de usuários na internet) com a matemática, de modo a identificar “cientificamente” os perfis das pessoas, ou algoritmos, direcionando-lhes mensagens, falsas ou não, por meio de robôs (bots) que influenciam (determinam) suas escolhas políticas.
O outro, Steve Bannon, foi o coordenador da campanha de Trump e seu assessor na Casa Branca. É também um homem inteligente e ultraconservador, sócio de Robert Mercer na empresa Cambridge Analytic: uma empresa que manipulou a última eleição norte-americana, desfazendo-se em seguida, quando o escândalo veio à tona. (Descobriu-se também que Bannon assessorou a campanha de Bolsonaro no Brasil.)
Se tudo isso for verdade – como parece que é -, se de fato algumas poucas pessoas, usando a inteligência artificial na internet e contando com uma legião de robôs para fabricar notícias falsas, reforçar preconceitos e dogmas, se essas pessoas podem realmente manipular eleições no mundo todo, então podemos entoar desde já o réquiem para democracia liberal capitalista – que já andava moribunda com tanta corrupção.
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