O PROCESSO de impeachment vai seguindo normalmente seus trâmites no Senado da República, o vice-presidente já está montando sua equipe de governo (?) para assumir o Palácio do Planalto, o PMDB se prepara para comandar o país mais uma vez, a operação Lava Jato vai pouco a pouco sumindo das manchetes dos jornais, o país está voltando ao curso “normal” de sua história, e a única coisa que sobrou mesmo é saber se o impedimento de Dilma Rousseff é golpe ou não é golpe.
O governo e a esquerda dizem que é golpe; a oposição e a direita dizem que não é. Os argumentos de uns e de outros já foram exaustivamente debatidos e analisados na imprensa, nos lares e nos bares – só na Câmara Federal é que os deputados não analisaram nada, deixaram tudo por conta de Deus; numa votação grotesca que deflagrou o processo de impeachment
Creio até que ninguém aguenta mais as análises jurídicas sobre os “motivos”, segundo uns, ou sobre os “pretextos”, segundo outros, que serviram de base para a propositura da ação penal de impedimento contra a presidenta Dilma Rousseff. A discussão sobre “motivos” e “pretextos” não foi suficiente para se chegar à conclusão sobre se é golpe, ou se não é golpe, a deposição da presidenta da república.
Os que entendem que essa deposição tem “motivos” jurídicos suficientes não abrem mão de suas certezas, e pronto; os que acham que a deposição está sendo feita com base apenas em “pretextos”, estão seguros de suas convicções, e pronto também – ainda não vi ninguém mudar de opinião: nem de um lado nem de outro. Assim, restou aberta somente a questão de saber se o impedimento da presidenta é golpe ou não é golpe.
E então: o que é um golpe?
O dicionário Houaiss define golpe como “choque, estratagema, ardil, trama ou manobra desleal”. Se o “motivo” ou “pretexto” do impeachment de Dilma se enquadra numa dessas definições é tarefa que deixo a cargo dos mais doutos; ou daqueles que ainda têm saco pra discutir juridicamente as acusações que se fazem à presidenta da república para retirá-la do posto aonde chegou pela vontade de mais de 54 milhões de brasileiros.
Não sei, portanto, se os tais “motivos” ou “pretextos” do impeachment constituem choque, estratagema, ardil, trama ou alguma manobra desleal, como diz o dicionário. Aliás, eu acho que até sei, mas não vem ao caso discutir isso agora, essa polêmica já rendeu muito, não foi suficiente para esclarecer quem deveria ser esclarecido, e na verdade tornou-se uma discussão de ouvidos moucos.
Mas, tem um dado na praça que a meu ver não deixa dúvida sobre a tese do golpe: metade dos senadores que agora vão julgar, e que já disseram que vão condenar Dilma Rousseff, votaram anteriormente a favor das suplementações de verbas orçamentárias pelas quais a presidenta está sendo acusada.
Não acredita? Pois é isso mesmo: os senadores-juízes autorizaram a conduta da presidenta no orçamento, legalizaram essa conduta, aprovaram suas contas, e agora dizem que a conduta dela é crime. Quer dizer, os juízes pretendem condenar a presidenta da república por ter praticado os atos que eles (juízes) disseram, por lei, que ela poderia praticar.
Cá entre nós: se isso não for estratagema, se isso não for ardil, se não for trama ou manobra desleal, enfim, se isso não for golpe então não existe golpe; ninguém sabe o que é golpe, e o único golpista deve ser mesmo o Antonio Houaiss com seu dicionário fajuto que não foi capaz de convencer ninguém.
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